sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Recurso previsto e Habeas Corpus

http://www.conjur.com.br/2016-dez-01/existe-recurso-especifico-habeas-corpus-desconsiderado

FERRAMENTA ADEQUADA

Se existe recurso específico, Habeas Corpus deve ser desconsiderado

O Habeas Corpus não pode ser utilizado para contestar decisão contra a qual exista previsão de recurso específico no ordenamento jurídico. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça foi aplicada pelo ministro Jorge Mussi, em caso no qual negou liminar em HC impetrado pela defesa de um médico condenado a 16 anos e 4 meses de prisão, em regime inicial fechado, por ter matado com dois tiros a mulher.
De  acordo com o relator, o pedido de liminar se confunde com o pedido principal do Habeas Corpus e, por isso, é conveniente que o caso seja analisado mais detalhadamente no momento de seu julgamento definitivo pelo colegiado.“O deferimento do pleito liminar em sede de Habeas Corpus, em razão de sua excepcionalidade, enseja a demonstração e comprovação, de plano, do alegado constrangimento ilegal, o que não ocorre in casu”, argumentou o ministro.
Jorge Mussi solicitou ao Tribunal de Justiça de São Paulo informações sobre o andamento da ação penal em desfavor do médico. A condenação foi imposta em outubro de 2016. O mérito do Habeas Corpus será julgado pelos cinco ministros que integram a 5ª Turma do STJ, especializada em Direito Penal. Não há previsão de data para o julgamento.
A defesa contesta a execução provisória da pena, mas, conforme observou o relator, deixou de instruir o pedido com a cópia do acórdão do TJ-SP, que determinou o cumprimento imediato da condenação, “documento indispensável à análise e reconhecimento da alegada ilegalidade”.
Jurisprudência de HC no STJ
Com base em precedentes do tribunal, a Secretaria de Jurisprudência do STJ identificou 18 teses sobre Habeas Corpus na corte. As teses estão reunidas na 36ª edição do Jurisprudência em Teses, ferramenta que apresenta diversos entendimentos da corte sobre temas específicos. 
Uma das teses destacadas afirma que o trancamento da ação penal pela via do Habeas Corpus é medida excepcional, admissível apenas quando demonstrada a falta de justa causa (materialidade do crime e indícios de autoria), a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade. O entendimento foi adotado com base em diversos precedentes, entre eles o RHC 55.701, julgado pela 5ª Turma em maio de 2015.
Outra tese afirma que o reexame da dosimetria da pena em Habeas Corpus somente é possível quando evidenciada flagrante ilegalidade, sem exigir análise do conjunto probatório. Um dos julgados tomado como referência foi o HC 110.740, da 6ª Turma, julgado em maio de 2015. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Proteção constitucional do cidadão (?). "Teoria da Perseguição intensa" os EUA

http://www.conjur.com.br/2016-dez-02/tribunal-eua-supervaloriza-doutrina-perseguicao-intensa

EXIGÊNCIAS PREMENTES

Tribunal dos EUA supervaloriza doutrina da "perseguição intensa"

Em uma decisão por quatro votos a três, com dissidências um tanto ríspidas, o Tribunal Superior de Wisconsin determinou que um policial pode violar a proteção constitucional do cidadão contra buscas e apreensões desarrazoadas, sem mandado judicial baseado em causa provável, invadindo a casa de um “suspeito” após uma perseguição. No caso perante a corte, a origem da perseguição do carro do “suspeito” foi uma luz de freio defeituosa.
A doutrina da “perseguição intensa” (hot pursuit) não é nova, mas também não é tão flexível. Ela prevê que policiais podem entrar em quaisquer recintos (incluindo residências), onde o suspeito de um crime se refugiou, sem mandado judicial, quando a demora para conseguir o mandado pode colocar suas vidas ou de outros em perigo ou possibilitar a fuga do possível perpetrador de um crime.
Essa permissão à polícia deriva de uma outra figura jurídica, a da “circunstância premente” (exigent circumstance), na qual a maioria dos ministros do tribunal se baseou para estabelecer uma ligação entre a luz do freio defeituosa, a perseguição, a entrada na casa para prender o “suspeito” sem mandado e novos delitos que emergiram subsequentemente.
De acordo com o voto da maioria, escrito pela ministra Annette Ziegler, em abril de 2012 o policial Calvin Dorshorst percebeu que uma luz de freio do carro de Richard Weber, logo a sua frente, não estava funcionando. E lhe pareceu que Weber não dirigia em linha reta, o que sugeria embriaguez do motorista. O policial acionou as luzes da viatura e a sirene, o que indica ordem de parar.
A 30 metros de sua casa, Weber não parou. Entrou na garagem, e o policial estacionou logo atrás. Os dois saíram de seus carros ao mesmo tempo, Weber se dirigiu à porta que dava acesso ao interior da casa, o policial correu e o alcançou quando ele já havia entrado. O policial o puxou para fora e com a ajuda de outro policial que havia chegado para ajudar, algemou Weber.
Com permissão do “suspeito”, o policial fez uma busca no carro e encontrou um pouco de maconha e um cachimbo de fumar maconha, ainda com cheiro da droga. E suspeitou, pela fala de Weber e pelo cheiro de bebida, que ele andou bebendo e dirigindo. Os policiais prenderam Weber e o levaram para o hospital, onde um exame de sangue detectou que o nível de concentração de álcool era bem maior do que o admissível para dirigir.
Weber foi processado, mas sua defesa pediu ao juiz para suprimir todas as provas (à exceção da luz de freio defeituosa), porque elas foram obtidas ilegalmente. Isso é um procedimento comum de julgamentos criminais nos EUA: provas obtidas ilegalmente não são aceitas pelo juiz. E as provas de uso de droga e de embriaguez foram obtidas porque os policiais teriam violado a proteção constitucional de Weber de não sofrer busca e apreensão sem mandado judicial. A defesa também alegou que a prisão foi ilegal.
Todos os julgamentos, em primeiro grau, recurso e tribunal superior, giraram sobre essa questão: se toda a operação policial violou a Quarta Emenda da Constituição dos EUA (a da garantia contra buscas e apreensões sem mandado) ou se a necessidade de um mandado foi sobrepujada pela “circunstância premente” de o policial estar uma “perseguição intensa” de um suspeito fugitivo, que cometeu delitos puníveis com prisão, de acordo com o voto.
Em primeiro grau, o juiz deu razão à polícia. O tribunal de recurso, por sua vez, deu razão a Weber, entendendo que seus direitos foram violados. E o tribunal superior reverteu a decisão do tribunal de recursos, fazendo valer a decisão de primeiro grau. Tudo na mais ampla discordância entre os juízes envolvidos no caso.
O voto vencedor do tribunal superior disse que se caracteriza a “circunstância premente” que gerou a “perseguição intensa” de um suspeito em fuga, que, no final das contas, cometeu os delitos puníveis com prisão de “fugir da polícia” e “resistir ou obstruir o trabalho policial”. A entrada do policial além da porta, segundo a ministra relatora, se deveu à necessidade de impedir que Weber continuasse fugindo.
O voto dissidente, escrito pela ministra Rebecca Bradley, declarou: “Os fatos objetivos aqui relatados não dão suporte à causa provável para delitos puníveis com prisão e não estabelecem qualquer circunstância premente. Em vez disso, os fatos mostram um policial preocupado com uma luz de freio defeituosa, que não tinha qualquer necessidade urgente ou imediata de passar além da soleira da porta da casa, sem primeiro conseguir um mandado judicial”.
A ministra diz que não exclui a necessidade de perseguição. Mas entrar na casa sem mandado é outra coisa. O voto da maioria, segundo ela, está mostrando à população que o arbítrio sobre “causa provável” para justificar buscas e apreensões não está nas mãos de um juiz e da Constituição, mas nas mãos de um policial.
Em voto dissidente ainda mais contundente, a ministra Ann Walsh Bradley, escreveu: “O voto vencedor corrói os direitos constitucionais de todos nós. Ele estabelece uma trajetória em que, gradualmente e de forma quase despercebida, nós poderemos acordar um dia e descobrir que as nossas liberdades, pelas quais muitos lutaram e se sacrificaram, foram gravemente restringidas”.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

SURSIS PROCESSUAL. APLICAÇÃO



Sursis processual
Pena mínima
Art. 89 da Lei 9099-95
Havendo concurso de delitos, devem incidir os respectivos aumentos de pena para verificar o limite da aplicação do sursis.   
STJ 243
STF 723


JECRIM: COMPETÊNCIA E TRANSAÇÃO PENAL

Competência
Pena máxima
Composição e transação
pena máxima
Incide a causa de aumento no máximo e a de diminuição no mínimo.
Art. 61. Penas  não superior a 2 anos e contravenções.   Art.69. Analisar individualmente cada tipo penal. Art. 70 ou 71 -  despreza-se a causa de aumento, trabalhando somente com o tipo  penal mais grave.
Art. 74§ único. Composição dos danos civis. Ação penal privada e ação penal pública condicionada á representação. Homologação. Extinção da punibilidade.
O resultado dessa operação deve ser uma pena máxima não superior a 2 anos.
A regra da soma das penas não deve ser utilizada na aplicação da transação e da composição.
Art. 69 CP (Deve-se somar as penas máximas em abstrato).B) art. 70 (1/6  a ½) ou art. 71. 1/6 a  2/3, deve -se considerar o maior aumento, sempre buscando a pena máxima*. Tem prevalecido na jurisprudência. Entretanto, a questão é  controvertida na doutrina.
Lesão leve (129 – 3 m a 1 ano) Conexo (121 – 6 a 20) tribunal do júri. Penas devem ser isoladas para fins de incidência dos institutos. EX: Art. 138 ( 6m a 2 anos) em concurso material c/c 140 ( 1m a 6 m). De forma isolada podem ser oferecidas a transação e a composição.  Art. 60§ único.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Prova indireta no Crime de tráfico. 6a. Turma do STJ

Prova indireta ??!

Segundo  a 6a.  Turma do STJ, "a ausência de apreensão da droga não torna a conduta atípica se existirem outros elementos de prova aptos a comprovarem o crime de tráfico. No caso, a denúncia fundamentou-se em provas obtidas pelas investigações policiais, dentre elas a quebra de sigilo telefônico, que são meios hábeis para comprovar a materialidade do delito perante a falta da droga, não caracterizando, assim, a ausência de justa causa para a ação penal". ( HC 131.455-MT... ). 

terça-feira, 4 de outubro de 2016

DENÚNCIA GENÉRICA. CRIME SOCIETÁRIO

http://www.conjur.com.br/2016-out-01/denuncia-generica-extingue-acao-penal-crime-societario
nOVO ENTENDIMENTO

Denúncia genérica extingue ação penal do Ministério Público por crime societário

A denúncia de crime societário não pode ser genérica, sendo necessária a descrição individualizada da conduta de cada acusado. Seguindo esse entendimento, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes concedeu Habeas Corpus e extinguiu ação penal do Ministério Público contra quatro sócios de uma editora, acusados de crime contra a ordem tributária.
De acordo com o ministro Gilmar Mendes, antes o STF mitigava a denúncia precisa nos crimes societários, contudo, esse entendimento vem sendo alterado na corte. O relator citou diversos precedentes que consideraram inadmissível a denúncia genérica para crimes societários.
"Assim, mesmo que nesses casos sejam de difícil descrição os pormenores das atividades e da responsabilidade de cada um dos denunciados, é fundamental que o mínimo descritivo dos atos ilícitos praticados esteja contido na denúncia para permitir o recebimento", explicou o ministro.
Os sócios administradores da editora foram acusados pelo Ministério Público pela suposta prática de crime contra a ordem tributária (artigo 1º, inciso I da Lei 8.137/90) por prestarem declarações falsas de faturamento ao Fisco, com o objetivo de reduzir o valor tributável. 
Após a denúncia ser recebida pela Justiça Federal de São Paulo, a editora ingressou com Habeas Corpus no Tribunal Regional Federal da 3ª Região que manteve o recebimento. De acordo com o TRF-3, a denúncia descreve de forma adequada os fatos imputados aos acusados, com base em contrato social que os aponta como os responsáveis pela administração da empresa. "Ademais, tratando-se de delito de autoria coletiva, não se exige que a denúncia individualize minuciosamente a conduta de cada denunciado", afirmou a corte regional.
Representada pelo advogado Alberto Zacharias Toron, do Toron, Torihara e Szafir Advogados, a editora tentou ainda anular a decisão no Superior Tribunal de Justiça, que também negou o pedido de Habeas Corpus por considerar suficiente a descrição dos crimes apontadas na denúncia.
O STJ considerou também a jurisprudência da corte, no sentido de que, "nos crimes societários, não se exige a descrição individualizada da conduta de cada acusado, bastando a narrativa do fato delituoso e a indicação da suposta participação do agente, possibilitando-se o exercício da ampla defesa".
A defesa da empresa ingressou então com HC no Supremo Tribunal Federal. No pedido, Toron alegou constrangimento ilegal, tendo em vista a falta de pressupostos mínimos da denúncia. Segundo o advogado, a denúncia é genérica contra todos os sócios com alegados poderes de gerência. 
Considerando o novo entendimento do STF, o ministro Gilmar Mendes determinou a extinção da ação penal. Em sua decisão, o ministro explicou que em matéria de crimes societários, a denúncia deve expor, de modo suficiente e adequado, a conduta atribuível a cada um dos agentes, de modo que seja possível identificar o papel desempenhado pelos denunciados na empresa.
O ministro explicou que dos seis sócios da empresa, quatro são qualificado como professores, se dedicando à profissão intelectual, não à atividade empresarial. "É muito provável que alguns dos acusados tenham figurado na administração da sociedade na crença de que estariam praticando atos legítimos de planejamento tributário, sem maior conhecimento das declarações fiscais", explicou o ministro.
Nesse contexto, segundo o ministro Gilmar Mendes, a acusação deveria ter identificado os efetivos responsáveis pelas declarações alegadamente fraudulentas oferecidas ao Fisco. "No entanto, o Ministério Público optou por simplesmente denunciar todos os seis sócios que figuram no contrato social como responsáveis pela gestão", complementou, considerando insuficiente a descrição das condutas dos denunciados e determinando a extinção da ação penal."

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Os juizados criminais e a filosofia comunicativa.

 juizados criminais e a filosofia comunicativa. www.ambito Jurídico.com.br

Os juizados criminais e a filosofia comunicativa.

Uma abordagem crítica 
por Claudia Aguiar Britto

http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?

n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17937&revista_caderno=22
Resumo: O presente artigo tem por objetivo apresentar algumas reflexões críticas a respeito dos vinte e um anos da criação dos juizados especiais criminais. Com essa perspectiva, analisamos a então proposta legislativa de se buscar um processo mais simples, ágil, de acesso fácil e direto; porém, em contraponto à realidade prática do procedimento especial criminal.  Assim, como referencial teórico, utilizamos uma abordagem filosófica e algumas reflexões a partir do agir comunicacional habermasiano.
Palavras-chave: juizados criminais - atos de fala  -  Agir comunicativo.
Abstract: The present article is aimed at presenting some critical reflections on the twentieth anniversary of the creation of special criminal courts. With this perspective, we analyze the legislative proposal to seek a simpler process, agile, easy and direct access; however, in contrast the practical reality of the criminal procedure. As a theorical referential we made use of a philosofical approach and some reflexions based on the Habermasian communicative action.
Keywords:  criminal courts - speech acts- communicative action
Sumário.     1. Introdução. 2. A filosofia do Agir comunicativo no âmbito do Jecrim. 3. A fragilidade do sistema de justiça criminal no Brasil. 4. O modelo de “barganha penal”. 5. Perspectivas para uma Justiça Restaurativa. 6. Conclusão. Referências Bibliográficas.
1. Introdução
Comemorar-se-á no dia 26 de setembro de 2016, o surgimento da Lei 9.099/95 - que instituiu os juizados especiais e ofereceu, sobretudo para a justiça penal, mecanismos dissuasórios de resolução da controvérsia (tais como a composição de danos civis, a transação penal e a suspensão condicional do processo)
 Contudo, algumas inquietações ainda possibilitam argumentações no plano prático. Pode-se dizer que essa “desformalização” do processo e das controvérsias a partir da solução consensual é relativamente recente na seara penal brasileira. Enquanto a primeira vertente representou a ideia de buscar um processo mais simples, ágil, de acesso fácil e direto, a outra pretendeu alçar instrumentos capazes de evitar o processo, mediante mecanismos institucionalizados de mediação.
Lembra Scarance[i] que a Lei 9.099/95 representou uma verdadeira revolução no sistema brasileiro, libertando a justiça para o consenso em matéria penal, mas que, à época, fortes resistências foram empreendidas na área criminal com vistas a impedir qualquer abertura no sentido de disponibilidade da ação e do processo, porque “percebeu-se que o Estado, a partir dos estudos criminológicos, não tinha condições de, com eficácia, dar vazão à intensa demanda da criminalidade”.
A proposta trouxe também a ideia de uma forma alternativa pela via procedimental, isto é, uma fase pré-processual de natureza conciliadora, na qual deveria ser tentado um acordo (composição dos danos civis). Primeiro, entre o suposto autor do fato e a vítima (dependendo da qualificação jurídica). Numa segunda via, por meio da transação penal, estimulava-se a negociação entre o MP e o suspeito da prática delitiva, a fim de evitar o processo criminal. Supostos agentes praticantes de infrações menos graves poderiam receber uma medida despenalizadora proposta pelo MP e homologada pelo juiz, que, depois de cumprida pelo suspeito, extinguiria a sua punibilidade. Quando aceita pelo autor do fato, a transação implicaria na submissão a uma das penas alternativas previstas no art. 43 e seguintes do Código Penal. Outro mecanismo com vistas a afastar o processo criminal viria através do sursis processual (cujos moldes foram abarcados, em boa medida, a partir do modelo do sursis penal, constante no art. 77  do Código Penal).
Nesses quase vinte e um anos de existência da Lei, muitos comemoram. Afinal, dela resultou uma enormidade de resoluções de controvérsia, por meio de medidas despenalizadoras, afastando o pretenso autor do fato de sanções mais duras. Outros, porém, se juntaram ao exército daqueles soldados que, desde o início se opuseram, com veemência, ao mecanismo do Jecrim.
 Vários são os argumentos contrários ao modelo de justiça consensual, sobretudo porque pesa sobre ele a ofensa aos direitos humanos, principalmente aqueles relacionados aos direitos fundamentais. A repulsa ao mecanismo do consenso está muito mais ligada ao plano das garantias processuais, especialmente no que se refere à transação penal porque, através da possibilidade do acordo entre as partes, se acena com a perspectiva de que o réu venha a se conformar com a acusação em troca de sua renúncia ao direito de exercer plenamente as garantias advindas da cláusula fundamental do devido processo legal. Segundo esse pensamento, a “chantagem” ao réu surge nas ameaças a um tratamento mais rigoroso, de uma pena mais severa, do risco de um cálculo errado, para todo aquele que se negue a negociar[ii]
Evidentemente que toda essa roupagem oferecida pela citada lei realmente não poderia surtir - como não surtiu - o efeito desejado. A começar pelo fato de que, ainda que se quisesse dar celeridade às causas relativas às infrações menos graves, seria necessário, dentro de um ambiente democrático, que os envolvidos fossem instados a falar, que pudessem ser ouvidos. Haveria como há de haver espaço para que, através do diálogo, os participantes manifestem suas disposições.[iii]
II. A filosofia do agir comunicativo no âmbito do JECRIM

Mas o que significa pensar e agir, a partir da filosofia comunicacional de Habermas?  A racionalidade comunicativa sustentada pelo filósofo está basicamente focada no conceito de se “alcançar entendimento”; e para obtê-lo, os atores devem reconhecer intersubjetivamente as pretensões de validade propostas nos atos de fala. .  Alcançar um entendimento é um conceito normativo que supõe não coercitividade[iv].
Segundo o filósofo, para a obtenção do consenso sobre algo, as pretensões de validade do agir comunicativo devem estar presentes na relação intersubjetiva, porque todo consenso depende de um reconhecimento intersubjetivo de pretensões universais.  Inicialmente é necessário dizer que o consenso é compreendido de duas maneiras: por meio do chamado “consenso fático” (quotidianeidade) e do “consenso fundado” (racionalidade dos argumentos).  O consenso fundado está baseado em quatro pilares: a inteligibilidade, a verdade, a correção e a sinceridade.   Assim, é imprescindível uma linguagem acessível, clara. Por outro lado, o conteúdo que se deseja transmitir deve ser verossímil. As intenções propostas também devem permear-se de sinceridade. Por fim, a manifestação do falante deve ser correta e adequada dentro das regras e valores vigentes. Então, esse processo pelo qual se pode chegar a um entendimento se estabelece segundo as quatro fases descritas. A intersubjetividade é gerada exatamente no uso da linguagem comum, fruto do resultado de uma interação entre sujeitos capazes de falar e agir, e que se comunicam com o fito de se entenderem.   
Endereçando estas reflexões para o campo do processo penal, compreendemos que o Juiz e as partes devem tornar compreensível o sentido da fala na esfera da relação processual (inteligibilidade), devem reconhecer a verdade do enunciado oferecido através do ato de fala (veracidade). Também se postula que os interlocutores devem reconhecer a correção da norma (norma penal e constitucional) que, por meio do ato de fala, foi tida como cumprida. Alia-se às três classes acima, a quarta e última pretensão, ou seja, quando a sinceridade dos entes envolvidos não tiver sido posta em discussão. Trata-se da necessidade de buscar intersubjetivamente as manifestações dos participantes a partir de suas pretensões de validade. Os atores processuais devem ser capazes de orientar suas ações segundo pretensões de validade intersubjetivamente reconhecidas: a inteligibilidade, a verdade, a correção e a sinceridade[v].
Neste sentido, há que se dizer que  são as pretensões de validade, nada mais nada menos, que os fios condutores que irão ligar o motor dessa máquina linguístico-comunicacional que se aspira para o processo penal, sobretudo para os juizados criminais.
 Firma-se, com essa ideia, a necessidade de dotar os participantes de competência argumentativa – circunstância indissociável ao processo comunicacional. Sem esse nivelamento de habilidade de debate entre os envolvidos e o espaço suficiente à fala, o consenso não acontece. Justiça consensual, sem a busca efetiva de um entendimento, permeado pelas pretensões de base, não pode ser compreendida como justiça do consenso.
III. A fragilidade do sistema de justiça consensual no Brasil
Trabalhando com as perspectivas oferecidas no âmbito do Jecrim, é possível, à primeira vista, dizer que a chamada justiça consensual é, em tese, profilática; porém, na prática, pode ser bem traiçoeira, por diferentes motivos. Primeiro, e especialmente, por força da própria engrenagem do sistema legal, que permite, automaticamente, a remessa de peças da polícia para a justiça criminal sem que ninguém, em regra, possa frear isso. Em segundo plano, ademais, porque as formas “coativas” empregadas em face do autor do fato para que aceite a proposta de transação penal, não como escopo para pôr fim ao litígio e para a busca do consenso, mas baseado em estatísticas de “produtividade” e redução do espaço/custo financeiro de trabalho, constituem fenômenos corriqueiros, contrários à lógica do direito.
Esses dois pontos já seriam suficientes para demonstrar que o modelo de justiça consensual no Brasil é muito frágil. Frágil porque os profissionais envolvidos também não estão preparados para exercê-lo de forma convincente. A prática demonstra que, na maioria dos casos, as demandas são deixadas a cargo de conciliadores leigos, que parecem ser doutrinados a tentar a composição de danos e até mesmo a transação penal a qualquer custo. E quando não conseguem êxito, o órgão ministerial, que deveria intervir com maior responsabilidade, nem sempre assim o faz. Em geral, as partes que mais veementemente recusam o acordo acabam se tornando antipatizadas para a acusação.
Em termos de trâmite judicial, a baixa ofensividade dos delitos dessa competência pode ser refletida no animusjudicante e ministerial. Às vezes, a investigação para tais infrações, no que diz respeito ao onus probandi, por parte do órgão acusador, é tratada como mera circunstância. Assim, em nome do princípio da celeridade, aviltam-se direitos e a democracia perde espaço. Em outra vertente, embora a lei proponha o acordo entre os envolvidos, com a aceitação da medida despenalizadora pelo suposto autor do fato, essa resposta penal representa nada mais nada menos que uma indisfarçável, e muitas vezes indigesta, sanção penal. Embora se afirme que a aceitação das propostas não macula a “fac” (folha de antecedentes criminais) do aceitante para efeito de reincidência, fato é que o sujeito deverá cumprir uma das penalidades previstas no CP estipuladas pelo MP e homologada pelo juiz. O registro da aceitação da proposta, todavia, permanecerá para efeito de concessão ou não de novo benefício dessa natureza.
Por outro lado, não se observa, nesses juizados, o espaço e o tempo necessários para que o diálogo ocorra numa relação intersubjetiva em que os participantes reconheçam suas pretensões de validade. O princípio da celeridade (que norteia a estrutura dos juizados especiais) parece ser tão levado a sério - em sentido negativo -, que o que menos se vê nesse ambiente é o diálogo. Procedimentos são iniciados e terminados tão rapidamente que, na maioria das vezes, não se permite, nem mesmo, colocar em prática a própria oralidade (segundo princípio norteador dos Jecrim’s). É comum o uso de fórmulas prontas para as assentadas conciliatórias e termos padronizados de transação penal. No entanto, as estatísticas oficiais apontam, aparentemente, para exitosos e justos consensos. Mas consenso sem diálogo não é consenso. Justiça consensual sem diálogo não é justiça; trata-se apenas de um arremedo de Justiça. Um insólito retoricismo, se pudesse aqui exprimir o manuseio da expressão consensual nas cercanias da justiça.
A experiência dos juizados especiais criminais revela que o problema do acesso à justiça estatal não está resolvido. Para Ghiringhelli de Azevedo[vi], esse acesso depende mais da iniciativa administrativa dos setores que gerenciam o sistema do que de uma nova disposição legal; e resolver essa questão exige gastos, pontua o autor. De fato, a informalidade da justiça penal ainda não conseguiu desburocratizar-se, desapegar-se dessa estrutura cartorária, hermética, muitas vezes confusa e paradoxal.  Essa disposição administrativa e financeira, contudo, representa apenas uma pequena parte do problema em torno da justiça consensual. Para pôr em ordem os desalinhados procedimentais deve haver um esforço cooperativo ao diálogo das pessoas envolvidas.
O problema não está cingido apenas ao réu e à administração pública, que não dispõe de recursos financeiros para arcar com as demandas. O fato relaciona-se muito mais com a disposição e o compromisso dos atores processuais, com a abertura dialogal, do que propriamente com aquelas ligadas ao fomento financeiro.
 Outro dado importante nesse contexto é o que se refere à busca da verdade processual. Se, para alguns, o processo penal não favorece o descobrimento da verdade nos moldes formulados e empregados, na dura realidade forense dos juizados criminais, a verdade está longe, muito longe de se fazer enxergar.
Nessa esteira, uma análise da atuação dos Jecrim’s nesses quase vinte e um anos do surgimento da Lei 9.099 atesta que imaginar que as partes, ao dialogarem, diriam a verdade, promoveriam uma exata reconstrução dos fatos e reconheceriam suas responsabilidades, é negar uma realidade que salta aos olhos. A questão do acordo, da transação penal e até mesmo do sursis processual penal, se posta à luz da consensualidade, revelará que os participantes, ao tentarem ingressar num debate argumentativo, não conseguem ficar em pé de igualdade com os atores públicos do Estado, mantendo um nivelamento igualitário e suficientemente capaz de habilitá-los para um possível consenso.
IV. O Modelo de “barganha penal” (plea bargaining e guilty plea )
Em termos comparativos, o modelo de acordos e mediações na justiça criminal estadunidense é uma boa fonte de reflexões. A razão primária para a prevalência da negociação entre as partes é a eficiência e o controle administrativo[vii].  Muitos juízes e procuradores têm argumentado que um decréscimo substancial em acordos criaria um caos no sistema de justiça. Eles acreditam que a negociação é a sustentação essencial para a existência contínua de um sistema de justiça organizada. No modelo estadunidense, os mecanismos de solução de controvérsia do chamado sistema de “barganha penal” (plea bargaining e guilty plea) encontram adeptos e opositores.
Os defensores da negociação penal argumentam que o guilty plea (by pleading guilty the defendent):
1. assegura uma pronta e certa aplicação das medidas adequadas;
2. evita atraso na prestação jurisdicional e aumenta a probabilidade da pronta e certa aplicação de medidas corretivas aos acusados;
3. o acusado, reconhecendo a sua culpa, manifesta o desejo de aceitar a responsabilidade pela conduta;
4. evita ser submetido a um julgamento público, quando as consequências têm mais valor do que qualquer necessidade legítima para tal;
5. impede um excessivo dano ao defendente, a partir da forma convincente de condenação;
6. possibilita certas concessões quando o réu oferece cooperação na busca de outros elementos.
Por outro lado, os que se opõem à negociação pelo sistema guilty plea baseiam-se no fato de que existe um perigo real de pessoas inocentes serem condenadas. A crítica também se estende às diferenças de tratamento observadas nas sentenças (de negociação e julgamento). Tem sido alegado, por exemplo, que juízes induzem negociações impondo sentenças mais severas quando o réu escolhe o julgamento ao invés da negociação[viii].
Por outro lado, procuradores, ao barganhar, somente intencionam promover o andamento dos feitos e, por essa visão, barganhar é distribuir irregularmente e de forma desigual entre os envolvidos a habilidade para se conseguir, de forma leniente, um acordo. Assim, segundo H. Miller et al., barganhar remete a um mecanismo ineficiente e inútil, além do quê, aqueles que optam por um julgamento, isto é, que não aceitam submeter-se a acordos, acabam geralmente recebendo penas mais longas.
No caso de negociação por meio do plea bargaining, alguns compreendem que tal mecanismo é desastroso e deveria ser abolido porque, dentre outras coisas,  um  réu inocente a injusta e a inadmissível escolha de negociar sua condição jurídica para evitar um julgamento. Em linhas gerais, argumenta-se que a condenação, punição e litígio são produtos públicos com efeitos sociais poderosos, ao passo que os mecanismos em prol da negociação entre as partes (no estilo contratual) afastam a ingerência do Estado, ao mesmo tempo em que introduzem um aumento de custos às agências responsáveis pelos processos de negociação.
Para Schulhofer[ix], o acordo não irá melhorar o bem-estar das partes afetadas numa negociação. O réu inocente, diante de uma pequena possibilidade de condenação, poderia se interessar em aceitar uma condenação com uma pequena pena. Porém, a escolha do réu pela negociação pode ser racional através de sua própria perspectiva, mas isso impõe custos à sociedade, minando a confiança pública porque, se por um lado as condenações criminais transmitem uma mensagem de que o acusado é culpado, por outro, mantém íntegra uma dúvida razoável quanto à sua verdadeira culpabilidade.
No que concerne à mediação[x], desde 1984 ela é empregada na França e se desenvolve atualmente em larga escala. A palavra mediação remonta há séculos, algo em torno de 5.000 anos, e significava, inicialmente, segundo Morineau[xi], a ideia de se perpetuar o liame entre a divindade e os seres mortais, a conexão entre Deus e os homens (le lien à rétablir entre Dieu et les hommes). A história de toda a civilização é resultado da procura constante de se construir os fundamentos de um equilíbrio que dependa do próprio homem.  Por esse raciocínio, a mediação significa, portanto, o espaço oferecido para se estabelecer uma conexão entre aquele que clama por auxílio e o auxílio para aquele que precisa de proteção.
Com o exemplo do modelo consensual instituído em 1995 através da Lei 9.099 pareceu, à primeira vista, que seria possível desenhar um discurso prático mais eficiente. Todavia, os princípios fundamentais iniciais que vestiriam a então novata lei – da oportunidade regrada, da autonomia da vontade e da desnecessidade da pena de prisão (MOLINA, 2002, p. 60) – não foram suficientes para conduzir um procedimento que aparentemente serviria para pôr em prática o consenso e a mediação.
Em verdade, não seria ingenuidade pensar que a própria engrenagem do sistema legal pudesse permitir, automaticamente, a remessa de peças da polícia para a justiça criminal? Seria possível imaginar que, instantaneamente, de um dia para o outro, o cidadão comum (inscrito num registro de ocorrência) vem a tornar-se autor do fato e ter seu nome estampado nos registros judiciais? Não seria também um tanto ingênuo não supor que muitos desses registros – ainda – são confeccionados ao apagar das luzes das delegacias policiais, produzidos com fins estratégicos, além de utilizados, em significativa parcela, com o objetivo de angariar troca de favores nada lícitos (ameaças) ou mesmo para servirem de (re)negociações de dívidas escusas ligadas a fins econômicos? Da mesma forma, não seria ingenuidade pensar que as diferenças de forças no campo processual, agora entre as pessoas envolvidas diretamente no conflito, fossem realmente ajustadas ou supridas pelos conciliadores? A simples tramitação do procedimento penal inaugura não somente um irreparável constrangimento imposto ao suposto autor de uma infração diminuta, mas sobretudo, e potencialmente, o risco de uma futura restrição de direitos[1]. A realidade mostra que mediadores/conciliadores, muitas vezes, não só não dispõem de capacidade para a condução de um diálogo fundado, mas, sobretudo, não estão devidamente capacitados para compreender as disparidades encontradas, em boa medida, entre as partes envolvidas.
Por outro lado, como já ressaltado em linhas anteriores, as formas coativas empregadas em face do autor do fato para que aceite a proposta de transação penal, não como objetivo central à busca do consenso, mas baseado em estatísticas de produtividade e redução do espaço/custo financeiro de trabalho, também é observável na práxis cotidiana. Com efeito, a proposta de transação, quando aceita nessas condições, representa um consenso ingênuo, pois não foi submetido a um assentimento racional. Um dos envolvidos (no caso, o autor do fato) acaba concordando com a proposta transacional sem a devida e exata compreensão do que efetivamente acordou com o MP e com a Justiça.
V. Perspectivas para uma Justiça Restaurativa
Nessa linha, a então novata (pelo menos em solo brasileiro) Justiça Restaurativa com gritos de repúdio ao processo punitivo de viés opressivo, propugnando a via da resolução de problemas de forma colaborativa. Abordagens e práticas restaurativas proporcionariam, segundo idealizações, a oportunidade de a vítima e o infrator manifestarem seus sentimentos, expressarem-se, descreverem como foram atingidos e dizerem de que maneira o conflito poderia ser apaziguado e solucionado. Afastando a figura pesada e secular do Estado e seus representantes e transferindo o diálogo (entre vítima e infrator) para os grupos mais próximos à comunidade a que pertencem (ONG´s, associações comunitárias, de classe, centros universitários etc.), trabalha-se com a ideia de um sistema menos opressivo. Planos para reparar os danos sofridos ou o trabalho integrativo e interativo fincado e desenvolvido com vistas a evitar novos estorvos são sugestões bem alimentadas pela justiça restaurativa. Porém, ainda que nobre, a proposta, especialmente pela condição de deixar a figura do Estado sombreada, à margem do episódio conflitivo, enquanto os próprios envolvidos diretos resolvem suas pendências, corre o risco de ser mal sucedida; porque há de haver nisso tudo mecanismos cognitivos realmente satisfatórios e exequíveis. Não se chega a um entendimento sem que todos os participantes do diálogo possuam, de fato, o mesmo nível de conhecimento, de compreensão daquilo que se coloca à mesa do debate.
VI. Conclusão
Para concluir e retomando a perspectiva brasileira, considerando o entendimento como um processo que abrange uma série de atos de fala, poder-se-ia dizer que o ato de fala de um participante somente teria sucesso se o outro participante aceitasse a oferta contida nesse ato manifestando “sim” ou “não” à proposta do MP, apoiada em pretensões de validade.
Para que seja possível atender ao que dispõe o edifício comunicativo vislumbrado para a esfera do Jecrim, será necessário um verdadeiro esforço cooperativo dos participantes do diálogo: um novo pensar, agir e falar.  Quando os participantes pretenderem um acordo motivado racionalmente e entenderem que ele poderá ser alcançado, pelo menos a princípio haverá o espaço para o discurso e, consequentemente, para o alcance do consenso.
Contudo, o modelo de justiça consensual do Brasil que ainda se observa na prática cotidiana, como dito alhures, está longe de seguir o padrão comunicativo. Nele não há espaço para o consenso, porque não há espaço para o diálogo. Por outro lado, se há quem alegue que a verdade processual poderia ser extraída por meio do contraditório efetivo, tendo as partes reais condições de exporem seus argumentos e contra-argumentos, no formato Jecrim, essa proposta se esvai.
otas:
[1]     Veja-se a crítica de Morais da Rosa. (Guia Compacto do Processo Penal segundo a teoria dos jogos.  2013, p. 75), para quem os Juizados Especiais, embora equipados com “para-juízes”, não respondem a um mínimo de garantias a que o sujeito processado faz jus, democraticamente. Nessa linha contra os JECRIM’s, por todos: Miranda Coutinho (2005, p., 03-14). Recomenda-se leitura nesse contexto:
CARVALHO, Salo de; WUNDERLICH, Alexandre (Org.). Diálogos sobre a Justiça Dialogal. Teses e Antíteses sobre os processos de Informalização e privatização da Justiça Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. CARVALHO, Salo de; WUNDERLICH, Alexandre (Org.). Novos diálogos sobre os juizados especiais criminais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
[i]  SCARANCE, Antônio Fernandes Processo penal constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
[ii]  KARAM, Maria Lucia. Juizados especiais criminais: a concretização antecipada do poder de punir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
[iii] AGUIAR BRITTO. Processo penal comunicativo. Comunicação processual à luz da filosofia de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá. 2014. Artigo baseado no livro da autora e adaptado exclusivamente para fins acadêmicos.
[iv] HABERMAS, J. Agir comunicativo. v. I e II. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. São Paulo: Martins Fontes, 2012, v.1.
[v] AGUIAR BRITTO. Processo penal comunicativo. Comunicação processual à luz da filosofia de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá. 2014.
[vi]GhIringhelli de Azevedo. Conciliar ou punir? Dilemas do controle penal na época contemporânea. In:Diálogos sobre a justiça dialogal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. pp. 55-79.
[vii] MILLER, H. McDONALD, W. CREMER, J. Plea bargaining
 in the United States (1978). In: guilty pleas and bargaining. Chapter nine. American criminal Procedure, cases and commentary. Fifth edition. Stephen A. Saltzburg, Daniel J. Capra, West Punishing Co, 1996, St Paul. Em tradução livre da autora.
[ix]  SCHULHOFER. 101, Yale L. J. 1979 (1992), (op. Cit.) p. 819. In Guilty pleas and Bargaining. AMERICAN CRIMINAL PROCEDURE. Cases and commentary. fifith edition. Stephen A. Salztburg. Daniel J. Capra. St PualkMinn: West Publishing Co. 1996. Em tradução livre da autora
[x] Cf. Prado (2002, p. 89): A mediação comporta a intervenção de um mediador – um árbitro – absolutamente desinteressado do resultado material do acerto entre as partes, mediador que se dispõe a intervir unicamente para tentar fazer com que as partes resolvam de forma consensual o dilema que as contrapõe. Justiça penal consensual. In: WUNDERLICH, Alexandre; CARVALHO, Salo de (Org.) Diálogos sobre a justiça dialogal: teses e antíteses sobre os processos de informatização e privatização da justiça penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. pp. 81-97.
[xi] MORINEAU, Jacqueline. Des origines de la médiation “humaniste”. In: Sociologia del diritto n. 3, v. 34. pp. 165-174, 2007. Por livre tradução da autora.

PRISÃO E LIBERDADE. FURTO DE FUZIS. EXERCITO

http://www.conjur.com.br/2016-set-28/stf-mantem-prisao-soldado-acusado-furto-fuzis-exercito

QUEBRA DE HIERARQUIA

Supremo mantém prisão de soldado acusado de furto de fuzis do Exército


Por entender que a prisão preventiva de um soldado acusado de furtar dois fuzis do Exército tem justa motivação, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal negou o Habeas Corpus 135.047, no qual a Defensoria Pública da União buscava a revogação da detenção.




Na sessão dessa terça-feira (27/9), o colegiado entendeu que a prisão se justifica em razão da gravidade do crime, da conveniência da instrução penal e para a manutenção da hierarquia e disciplina militares.
O soldado, integrante do 6º Batalhão de Infantaria da Selva, sediado em Guajará-Mirim (RO), foi preso em flagrante com os fuzis. Em depoimento, confessou o furto e afirmou que percorreu uma trilha na selva para ingressar no acampamento militar, rasgou uma tenda onde dormiam recrutas, e de lá subtraiu as armas.
O juiz auditor converteu a prisão em flagrante em preventiva ressaltando a gravidade da conduta e o fato de que a região, na fronteira com a Bolívia, é conhecida rota de tráfico de drogas e armas. O Superior Tribunal Militar também negou o pedido de revogação da prisão ou sua substituição por medidas cautelares.
O relator do HC 135.047, ministro Gilmar Mendes, observou que o decreto de prisão foi devidamente fundamentado, e que a conduta descrita nos autos revelou o desrespeito do agente para com a hierarquia e a disciplina militares, além de representar risco à segurança do quartel.
Salientou que a concessão de menagem (instituto previsto no Código de Processo Penal Militar que se assemelha à liberdade provisória) é incabível no caso, pois a narrativa demonstra a gravidade do delito, a indispensabilidade da segregação cautelar para a conclusão do inquérito e a necessidade de manutenção da hierarquia e disciplina militares.
Justa causa
Também por unanimidade, os ministros indeferiram o HC 135.674, impetrado pela DPU contra acórdão do Superior Tribunal Militar que recebeu denúncia contra um soldado do 14º Batalhão Logístico, em Recife, pelo furto do celular de um colega.
Em primeira instância, a juíza auditora rejeitou a denúncia entendendo não haver justa causa para abertura de ação penal, uma vez que o tempo decorrido entre o furto e a devolução do celular foi exíguo. Como o objeto nem saiu do quartel, não houve ofensa ao bem jurídico tutelado, avaliou a julgadora.
Após recurso do Ministério Público Militar, o STM recebeu a denúncia por entender que há suporte probatório para a continuidade do processo. A DPU então pediu no Supremo o reconhecimento da atipicidade da conduta. Os defensores públicos também requereram a aplicação ao caso do princípio de insignificância, diante da ausência de prejuízo ao patrimônio do ofendido.
Em seu voto, o relator do HC, ministro Ricardo Lewandowski, destacou que o furto dentro de um estabelecimento militar é altamente reprovável, e deve receber persecução penal adequada. “Quando se trata de crimes dessa natureza, envolvendo militares, esta corte tem sido mais rigorosa do que em casos semelhantes envolvendo civis”, afirmou o ministro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

REFORMATIO IN PEJUS JÚRI

http://www.conjur.com.br/2016-set-28/juri-nao-agravar-pena-estabelecida-antes-fachin

REFORMATIO IN PEJUS

Novo júri não pode agravar pena estabelecida no primeiro, decide Fachin

Decisão tomada por segundo júri, feito por determinação judicial, não pode piorar a situação do réu que já havia sido condenado em outro Tribunal do Júri. Por isso, o ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, determinou que um condenado por homicídio sofra só as penas impostas a ele pelo primeiro julgamento, que não havia considerado o crime hediondo.
O réu havia sido condenado em dezembro de 2011 a 11 anos e oito meses de prisão por homicídio privilegiado-qualificado: incidiram na pena dele, ao mesmo tempo, os parágrafos 1º e 2º, inciso IV, do artigo 121 do Código Penal. O primeiro dispositivo atenua a pena caso o homicídio seja cometido “impelido por motivo de relevante valor social ou moral”. O último, aumenta a pena se o crime for cometido de forma que impossibilite a defesa da vítima.
Diante da condenação, somente a defesa recorreu, e pediu novo júri, o que aconteceu em 2013. Mas no novo julgamento, os jurados levaram em conta apenas a qualificadora e relevaram a atenuante, aumentando a pena do réu.
A defesa, então, foi ao Tribunal de Justiça de São Paulo alegar a inconstitucionalidade da segunda condenação, já que recurso da defesa não pode resultar em decisão pior ao réu – é a vedação ao chamadoreformatio in pejus, ou reforma em prejuízo do réu.
 A apelação foi parcialmente acolhida para restabelecer a pena do primeiro julgamento, mas não foi restabelecida a classificação do crime como qualificado-privilegiado, o que, em razão da hediondez, acarreta efeitos gravosos no âmbito da execução penal, como na progressão de regime.
Foi, então, impetrado Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça, que o rejeitou por entender que nem a sentença e nem o acórdão do TJ trataram de progressão de regime.
No Supremo, o ministro Fachin explicou que a pena não é o único elemento da condenação que pode resultar em situações desfavoráveis à vida do réu. Questões laterais, como prazos para progressão de regime, também podem resultar em reformatio in pejus, proibido pelo artigo 617 do Código de Processo Penal, escreveu o ministro.
Para os crimes comuns, a progressão para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, pode ocorrer quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior. Já nos crimes hediondos, a progressão de regime pode ser concedida após o cumprimento de 2/5 da pena, se o apenado for primário, e de três quintos, se reincidente.
Fachin, então, afirmou que , no caso dos autos, é irrelevante o fato de que a progressão de regime não tenha sido tratada na sentença ou no acórdão de apelação, pois os requisitos para a concessão de benefícios na execução da pena estão expressamente previstos em lei. Com informações da assessoria de imprensa do STF.

sábado, 24 de setembro de 2016

Lei de Drogas e a situação carcerária

Lei de Drogas teve efeito inverso e piorou situação carcerária, apontam especialistas

Por  www.conjur.com.br
Se a chama Lei de Drogas foi editada com a intenção atenuar o excesso de punitivismo estatal, o efeito prático foi o contrário, apontam especialistas. Editada em 2006, a lei aumentou as penas por tráfico, mas criou punições alternativas para usuários e ampliou o uso de medidas cautelares. Mas o que aconteceu desde então foi o aumento da população carcerária, impulsionado principalmente por condenações por tráfico.
Agora, o Poder Judiciário tenta reequilibrar a questão por meio de decisões consideradas progressistas, como a que disse que o tráfico privilegiado não é crime hediondo, tomada pelo Supremo Tribunal Federal no primeiro semestre deste ano. E desde 2015 discute se é constitucional considerar crime o porte de drogas para consumo pessoal.
O período de dez anos da lei que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas foi analisado em um seminário feito pela Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp). Nesta sexta-feira (23/10), o ministro Gilmar Mendes, do STF, disse que a lei foi feita com o intuito de mitigar o tratamento que se dava ao usuário, mas que surpreendentemente o número de presos aumentou.
“Esse tema também gera um debate sobre controle de constitucionalidade. A Suprema Corte de um país pode alterar a decisão tomada pelo legislador?”, questionou Gilmar. A resposta pode ser retirada de seus votos. Votou peladescriminalização do porte de qualquer droga e pelo afastamento da condição de hediondo do crime de tráfico privilegiado.
Triste crescimento
Em um painel mais cedo, Valdirene Daufemback, diretora de políticas penitenciárias do Departamento de Políticas Penitenciárias do Ministério da Justiça, o Depen, despejou uma série de dados que fazem pensar, temer e lamentar.
  • O Brasil tem a 4ª população mundial de presos.
  • Se o ritmo de encarceramento desses países continuar como é agora, o Brasil irá para a 1ª posição em 2050.
  • O Brasil tem uma média de 304 presos para 100 mil habitantes, mais que o dobro da média mundial
  • Nos últimos 15 anos, o Brasil foi o 2º país no qual a população carcerária mais cresceu, atrás da Indonésia
  • De 1990 a 2014, a população carcerária brasileira aumentou 575%
  • 41% dos presos são provisórios
  • O risco de ser assassinado dentro de um presídio é seis vezes maior do que nas ruas
Valdirene afirma que essa explosão tem “tudo a ver com a guerra às drogas”. E, mais especificamente, com a Lei de Drogas de 2006. “O texto mudou a tipificação pela qual as pessoas passaram a ser presas. E o resultado é que aumentou muito o número de pessoas presas por tráfico. Aumentou também o número de negros presos, consequência direta da lei”, disse a diretora do Depen.
Lei cega
Dividindo a mesa com Valdirene estava o desembargador Otávio Augusto Almeida Toledo, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que disse ser também um severo crítico a lei. Segundo ele, o texto legislativo não consegue passar uma linha entre quem deve e quem não deve ser preso.
“Não vejo sucesso em uma política de drogas que permite que um usuário possa ser condenado por tráfico mesmo que seja usuário, tudo baseado na quantidade da substância que foi encontrada”, afirmou o desembargador. w.conjur.com.br

terça-feira, 13 de setembro de 2016

DONALD TRUMP e o efeito "mauzinho" de ser. Donald Duck Hells

Donald Duck Hells
Donald Trump e o efeito “mauzinho” de ser
Por Cláudia Aguiar Britto[1]


Por que Donald Trump e sua indefectível característica preconceituosa, racista,  xenófoba e manifestamente desmedida consegue influenciar parte da população que integra a maior potência econômica do planeta?  Está aí um enigma difícil de ser decifrado.
Há algum tempo, os “Michaels” têm se destacado. Desde Michael Jackson, passando por Michael Jordam, Michael Jonhson e Michael Phelps, os astros norte-americanos têm projetado suas marcas pelo mundo; seja pelo esforço e dedicação nas atividades que desempenham, seja pelas mensagens transferidas por meio de letras e melodias, por atitudes ou discursos. Entretanto, por outra vertente, o efeito “mauzinho”  de ser de Donald Trump tem prevalecido na América.
Nos palanques políticos e nas esferas midiáticas, Trump já foi capaz de dizer que os mexicanos “trazem as drogas, trazem o crime e os estupradores”... E que pretende construir um muro separando os países. O candidato chegou a questionar a saúde mental do atual Presidente por ter permitido a entrada de pessoas com ebola nos EUA; indignou-se com a possibilidade de homens negros contarem a sua fortuna,  vociferando que: “homens negros contando o meu dinheiro?!” “Eu odeio isso !”  E ainda  reacendeu o confronto ao afirmar que bombardearia todo o petróleo do Estado islâmico no Iraque e mandaria grandes corporações construírem por lá... E por aí vai... A metralhadora giratória de Donald não para. 
Ainda que toda essa carga ideológica implantada na fala do candidato  esteja centrada nos Estados Unidos,  é preciso compreender que em um  mundo globalizado os sintomas e as consequências desse tipo de discurso  são sentidos de imediato em todos os cantos. A ideologia discriminatória consegue realmente ultrapassar os limites da sua atuação para alcançar outras nações e seus sistemas jurídicos internos, cujos interesses são significativamente diversos.
Como se sabe, os discursos servem para transformar, sair do “ponto zero”, progredir, mas também existem e persistem aqueles que são utilizados para destruir.
Nunca é demais relembrar o fato de que o totalitarismo nazifascista e o holocausto concebiam um modelo de sociedade estruturado na razão. Os discursos empregados por seus mentores serviram para arregimentar um exército de vítimas da razão instrumental, conforme explicou Horkheimer. E os grupos vulneráveis, os camponeses, artesãos, comerciantes, pequenos empresários, as donas de casa e toda massa de gente que constituía a classe média alemã, paradoxalmente, formariam o apoio ativo que levou os nazistas a tomarem o poder.[i] Um texto do filósofo Heidegger publicado no jornal de estudantes de Freiburg em 1933 reforçaria assim a tese de  que ele servira de estímulo ao povo para encontrar a “grandeza e verdade” de sua determinação. E esse “encontro” com a grandeza e a verdade pelo povo alemão desaguaria numa decisão suprema de sua própria liberdade. Ou seja: a vontade coletiva fora subsumida à vontade de seu Führer. [ii] A “verdade” da determinação do povo era nada mais do que a verdade de Hitler. A “decisão suprema de sua liberdade” significava, ao fim e ao cabo, o amalgamento, a pasteurização dos ideais hitlerianos.
Nas digressões de Perelman, quando usamos a argumentação, isto implica que renunciamos ao recurso único da força, dando apreço à adesão do interlocutor, impedindo que as pessoas sejam tratadas como objeto.   A comunicação tem realmente esse poder. Ela não é uma transferência unilateral de informação. Entretanto, parece ser evidente também, que a prática discursiva não tem como garantir sempre a integridade, a infalibilidade, a clareza, a segurança, o respeito ou a estabilidade de resultados e propostas.
Mais recentemente, Habermas conta que após o “11 de Setembro” passou a ser frequentemente indagado se, em razão desses fenômenos da violência, a concepção do agir orientado para o entendimento, tal qual ele desenvolvera na teoria do agir comunicativo, não teria ficado completamente desacreditada. Ele respondeu que, justamente porque as relações sociais de violência, agir estratégico e manipulação são realizados, não é possível ignorar dois outros fatores: primeiro, que a prática da convivência diária residiria numa base sólida e convicções comuns, evidências culturais, expectativas recíprocas; e, segundo, que os conflitos ocorreriam em razão dos distúrbios de comunicação.[iii]
            Como destaca o filósofo alemão, a espiral da violência começa com uma espiral de comunicação prejudicada através da espiral de uma desconfiança recíproca descontrolada, que leva à interrupção da comunicação. A destruição e a corrupção da linguagem especialmente sentidas nos países em desenvolvimento e os menos favorecidos trazem graves consequências, produzem drásticas reações, fazem operar uma espécie de “vingança dos oprimidos”, aventada por Habermas, para compensar o silêncio irrompido, sepulcral e autoritário que permeou e permeia os sistemas até hoje.
  Em razão das inúmeras declarações públicas discriminatórias, Donald tem sido alvo de severas criticas. Entretanto, parece não se importar com elas. 
             Na contramão do modelo de corresponsabilidade solidária, a qual se emprega o conceito  moderno de humanismo, e que se almeja para a sociedade do século XXI, Trump serve-se do efeito “mal-humorado - mauzinho - nefasto”  de Donald  Duck Hells. Uma espécie de Pato Donald dos infernos, cunhamos.  Em 1942, o famoso Pato Donald de Walt Disney foi forçosamente integrado à propaganda nazista. As histórias traçadas à época, inspiradas na “face do Führer”, mostravam Donald Duck à frente da produção de armamento bélico, bem como instado a contribuir com impostos destinados a patrocinar a guerra.      
Donald adota o modelo Duck. Não sabe nadar, não mergulha fundo, e, de vez em quando, se afoga nos seus próprios impropérios. E o que faz Donald Trump se tornar um ícone, se notabilizar e alçar uma visibilidade incomum?  O que faz Donald encontrar tantos adeptos dispostos a comprar o seu pacote recheado de ódio, discriminação e seletivização? Um pacote embrulhado com o papel nefasto da desunião? Vivemos realmente tempos sombrios ou tudo isso faz parte desse processo de depuração e expurgo? Da destruição do que estava encoberto?
Para toda evidência há outros tipos de exteriorização para as quais pode não haver boas razões. Muitas experiências podem estar ancoradas em fundamentos e argumentos, porém envoltas por suscetibilidades e desejos internos que não implicam necessariamente em bons propósitos.
A necessidade de se buscar e alcançar atitudes de responsabilidade social, solidária, cooperativa, “universalizada”; um modelo que atenda o outro na sua alteridade é premente.  Há de se ‘manter vivo o sentimento de humanidade’, como já destacou Habermas, aquele  respeito por todos e na responsabilização solidária geral de cada um pelo outro. O respeito não abarca apenas aqueles que são iguais, congêneres[iv], mas, sobretudo, aquele “outro” em sua alteridade, em suas diferenças e em suas idiossincrasias.
Queiram os deuses que o efeito “mauzinho” de Donald Duck Hells seja arrefecido, transformado e revigorado em ações positivas. O planeta Terra merece e agradece. As gerações futuras também.  A assimilação de uma “responsabilização solidária” pelo outro ‘como um dos nossos’, tendo como premissa a abolição de todas as formas de exclusão, integrando e incluindo os outsiders, parece ser uma das trilhas desse emaranhado processo construtivo de comunicação.
'Pato Donald dos infernos', mal humorado, rabugento ou ainda na versão “mauzinho”, só mesmo nos divertidos gibis.



[1] Cláudia Aguiar Britto. Pós doutora em Direitos Humanos e democracia. Doutora e Mestre em Direito. Professora Universitária. Advogada




[i] Habermas, J.  Agir comunicativo. v. I e II. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. São Paulo: Martins Fontes, 2012, v.1, p. 635.
[ii] Cf. Habermas (2010, p. 161): “[...] o povo alemão é chamado à votação pelo Führer. Porém, o Führer nada pede ao povo, antes lhe dá a possibilidade mais direta de uma decisão suprema na sua liberdade” [...]. Em outra passagem, Heidegger assim escreve: “A nossa vontade de auto responsabilidade nacionalista quer que cada povo encontre a grandeza e a verdade da sua determinação [...]. Há apenas uma única vontade para a existência plena do Estado. O Führer fez despertar essa vontade em todo o povo e moldou-a numa única decisão”. Direito e democracia entre facticidade e validade. v. I. 2. ed. Tradução de Flávio Siebeneicher. Rio de Janeiro: BTU, 2010.
[iii] Aguiar Britto. Processo Penal Comunicativo. Comunicação processual à luz da filosofia de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá. 2014.
[iv] HABERMAS, A inclusão do outro: estudo de Teoria Política. Tradução de Sperber G; Soethe, P. A.; Mota, M. C; 3. ed. São Paulo: Loyola, 2007 a. 201 pp. 7,8